domingo, 26 de agosto de 2012

Nelson Rodrigues

Em meu entendimento Nelson Rodrigues é o escritor mais autêntico, ácido e genial que se possa imaginar. Almodovar, em outra das artes se aproxima, mas continua aquém.
O texto abaixo foi extraído do livro "A vida como ela é...", Companhia das Letras - São Paulo, 1992, pág. 214.


Os Noivos - Nelson Rodrigues

Quando Salviano começou a namorar Edila, o pai o chamou:
— Senta, meu filho, senta. Vamos bater um papo.

Ele obedeceu:
— Pronto, papai.

O velho levantou-se. Andou de um lado para outro e senta de novo:
— Quero saber, de ti, o seguinte: esse teu namoro é coisa séria? Pra casar?

Vermelho, respondeu:
— Minhas intenções são boas.

O outro esfrega as mãos.
— Ótimo! Edila é uma moça direita, moça de família. E o que eu não quero para minha filha, não desejo para a filha dos outros. Agora, meu filho, vou te dar um conselho.

Salviano espera. Apesar de adulto, de homem-feito, considerava o pai uma espécie de Bíblia. O velho, que estava sentado, ergue-se; põe a mão no ombro do filho:
— O grande golpe de um namorado, sabe qual é? No duro? — E baixa a voz: — É não tocar na pequena, não tomar certas liberdades, percebeu?
Assombro de Salviano: "Mas, como? Liberdades, como?".

E o pai:
— Por exemplo: o beijo! Se você beija sua namorada a torto e a direito, o que é que acontece? Você enjoa, meu filho. Batata: enjoa! E quando chega o casamento, nem a mulher oferece novidades para o homem, nem o homem para a mulher. A lua-de-mel vai-se por água abaixo. Compreende?

Abismado de tanta sabedoria, admitiu:
— Compreendi.


A SOMBRA PATERNA

Na tarde seguinte, quando se encontrou com a menina, tratou de resumir a conversa da véspera. Terminou, com um verdadeiro grito de alma:
— Muito bacana, o meu pai! Tu não achas?

Edila, também numa impressão profunda, conveio: "Acho”.
— Concordas?

Foi positiva:
— Concordo.

Pouco antes de se despedir, Salviano batia no peito:
— Dizem que ninguém é infalível. Pois eu vou te dizer negócio: meu pai é infalível, percebeu? Infalível, no duro


O BEIJO

Nesse dia, coincidiu que a mãe de Edila também a doutrinasse sobre as possibilidades ameaçadoras de qualquer namoro. E insistiu, com muito empenho, sobre um ponto que considerava importantíssimo:
— Cuidado com o beijo na boca! O perigo é o beijo na boca!

A garota, espantada, protestou
— Ora, mamãe!

E a velha:
— Ora o quê? É isso mesmo! Sem beijo não há nada, está ,.tudo muito bem. OK. E com beijo pode acontecer o diabo. Você é muito menina e talvez não perceba certas coisas. Mas pode ficar certa: tudo que acontece de ruim, entre um homem e uma mulher, começa num beijo!


O IDÍLIO

Foi um namoro tranqüilo, macio, sem impaciências, arrebatamentos. Sob a inspiração paterna, ele planificou o romance, de alto a baixo, sem descurar de nenhum detalhe. Antes de mais nada, houve o seguinte acordo:
— Eu não toco em ti até o dia do casamento.

Edila pergunta:
— E nem me beija?

Enfiou as duas mãos nos bolsos:
— Nem te beijo. OK?

Encarou-o, serena:
— OK.

Dir-se-ia que este assentimento o surpreendeu. Insinua:
— Ou será que você vai sentir falta?
— De quê?

E Salviano, lambendo os beiços:
— Digo falta de beijos e, enfim, de carinho.

Sorriu, segura de si:
— Não. Estou cem por cento com teu pai. Acho que teu pai está com a razão.

Salviano não sabe o que dizer. Edila continua, com o seu jeito tranqüilo:
— Sabe que essas coisas não me interessam muito? Eu acho que não sou como as outras. Sou diferente. Vejo minhas amigas dizerem que beijo é isso, aquilo e aquilo outro. Fico boba! E te digo mais: eu tenho, até, uma certa repugnância. Olha como eu estou arrepiada, olha, só de falar nesse assunto!


O VELHO

Desde menino, Salviano se habituara a prestar contas quase diárias ao pai, de suas idéias, sentimentos e atos. O velho, que se chamava Notário, ouvia e dava os conselhos que cada caso comportava. Durante todo o namoro com Edila, seu Notário esteve, sempre, a par das reações do filho e da futura nora. Salviano, ao terminar as confidências, queria saber: "Que tal, papai?". Seu Notário apanhava um cigarro, acendia-o e dava seu parecer, com uma clarividência que intimidava o rapaz:
— Já vi que essa menina tem o temperamento de uma esposa cem por cento. A esposa deve ser, mal comparando, e sob certos aspectos, um paralelepípedo. Essas mulheres que dão muita importância à matéria não devem casar. A esposa, quanto mais fria, mais acomodada, melhor!

Salviano retransmitia, tanto quanto possível, para a namorada, as reflexões paternas. Edila suspirava: "Teu pai é uma simpatia!". De vez em quando, o rapaz queria esquecer as lições que recebia em casa. Com uma salivação intensa, o olhar rutilante, tentava enlaçar a pequena. Edila, porém, era irredutível; imobilizava-o:
— Quieto!

Ele recuava:
— Tens razão!


CATÁSTROFE

Um dia, porém, o dr. Borborema, que era médico de Edila e família, vai procurar Salviano no emprego. Conversam no corredor. O velhinho foi sumário: "Sua noiva acaba de sair do meu consultório. Para encurtar conversa: ela vai ser mãe!". Salviano recua, sem entender:
— Mãe?!...

E o outro, balançando a cabeça: "Por que é que vocês não esperaram, carambolas? Custava esperar?". Salviano travou-lhe o braço, rilhava os dentes: "De quantos meses?". Resposta: "Três". Dr. Borborema já se despedia: "O negócio, agora, já sabe: é apressar o casamento. Casar antes que dê na vista". Petrificado, deixou o médico ir. No corredor do emprego, apertava a cabeça entre as mãos: "Não é possível! Não pode ser!". Meia hora depois, desembarcava e invadia, alucinado, a casa do pai. Arremessou-se nos braços de seu Notário, aos soluços.
— Edila está nessas e nessas condições, meu pai! — E, num soluço mais,fundo, completa: — E não fui eu! Juro que não fui eu!


MISERICÓRDIA

Foi uma conversa que se alongou por toda uma noite. No seu desespero inicial, ele berrava: "Cínica! Cínica!". E soluçava: "Nunca teve um beijo meu, que sou seu noivo, e vai ter o filho do outro!". O pai, porém, conseguiu, após poucos, aplacá-lo. Sustentou a tese de que todos nós, afinal de contas, somos falíveis e, particularmente, as mulheres: "Elas são de vidro", afirmava. Alta madrugada, o pobre-diabo pergunta: "E eu? Devo fazer o quê?". Justiça se lhe faça - o velho foi magnífico: "Perdoar. Perdoa, meu filho, perdoa!". Quis protestar: "Ela merece um tiro!". Mais que depressa, seu Notário atalha:
— Ela, não, nunca! Ele, sim! Ele merece!
— Quem?

Baixa a voz: "O pai da criança! Esse filho não caiu do céu, de pára-quedas! Há um culpado". Pausa. Os dois se entreolham. Seu Notário segura o filho pelos dois braços:
— Antes de ti, Edila teve um namorado. Deve ter sido ele. Se fosse comigo, eu matava o cara que...

Ergue-se, transfigurado, quase eufórico: "Tem razão, meu pai! O senhor sempre tem razão!".


O INOCENTE

Pôde, assim; desviar da noiva o seu ódio De manhã, passou pela casa de Edila. Com apavorante serenidade, em voz baixa, pediu o nome do culpado. Diante dele, a garota torcia e destorcia as mãos: "Não digo! Tudo, menos isso!". Ele sugeria, desesperado: "Foi o Pimenta?". O Pimenta era o antigo namorado de Edila. Ela dizia: "Não sei, não sei!". Salviano saiu dali certo. Procurou o outro, que conhecia de nome e de vista. Antes que o Pimenta pudesse esboçar um gesto, matou-o, com três tiros, à queima-roupa. E fez mais. Vendo um homem, um semelhante, agonizar aos seus pés, com um olhar de espanto intolerável, ele virou a arma contra si mesmo e estourou os miolos. Mais tarde, desembaraçado o corpo, foi instalada a câmara-ardente na casa paterna. Alta madrugada, havia, na sala, três ou quatro pessoas, além da noiva e de seu Notário. Em dado momento, o velho bate no ombro de Edila e a chama para o corredor. E, lá, ele, sem uma palavra, aperta entre as mãos o rosto da pequena e a beija na boca, com loucura, gana. Quando se desprendem, seu Notário, respirando forte, baixa a voz:
— Foi melhor assim. Ninguém desconfia. Ótimo.

Voltaram para a sala e continuaram o velório.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Bondade, Maldade & Justiça


Desde sempre o senso comum reza que a justiça se fará de um jeito ou de outro. Vivemos em função de que a execução da justiça se dará a favor dos que foram, são ou serão bons na maior parte do tempo e trará revés àqueles que procederem ao contrário.
O conceito de ser bom, também conforme o senso comum, reside no fato de que as pessoas, apesar de possuírem uma natureza má, podem contrariar esta tendência e por força da imposição do bom-convívio em sociedade adotam um comportamento onde as boas atitudes são mais tomadas que as más, assim o sujeito é classificado como ‘bom’.
Empiricamente falando, estes conceitos são em sua totalidade o maior embuste praticado por todo viés religioso existente desde o surgimento da razão humana. Esta é a mais suja ferramenta utilizada pelo clero para oprimir e manter sob jugo os fiéis de todos os credos - Seja bom e tudo terminará bem, seja mau e tudo terminará mal.
O fato de contrariar a natureza ruim não trará nenhum benefício posterior, exceto aquele de preservar os direitos sociais estabelecidos por preceitos éticos. Pessoas cultivam sistematicamente, por vidas inteiras, um procedimento tido como exemplar e mesmo assim podem terminar suas jornadas em absoluto processo holístico degradativo.  Outros se deleitam na degradação durante sua existência e a vida pode terminar num simples suspiro. Como explicar? O senso comum dá a mais fugaz resposta:  “É mistério” – E se conforma.
           Tudo que acontece com o homem ou é consequência de suas escolhas ou é fruto do imponderável, imputar peso à justiça em função de bom ou mau comportamento, excetuando-se o Ético, é um erro - Que não cometo mais.

sábado, 18 de junho de 2011

Mãos

Estava digitando umas coisas e ao observar minhas mãos me dei conta que estão meio enrugadas, daquele jeito quando se consegue ver as pequenas divisões polimorfas que juntas compõem a pele... fiquei assustado. Comecei uma discussão interna:
- Estou ficando velho!!!
- Que velho? Só tenho 41 anos...
- Então, isso é mais que a metade da vida!!!
- Mas meu espírito é de um menino...
- Tá vendo? Argumento de quem é velho!!!
- Vai te lascar, eu jogo Squash e ganho a maioria das partidas...
- Mas termina a sequência botando os bofes pra fora!!!
- Sem essa, eu escrevo para meu blog, Adoro vinho e Sou um bom cozinheiro...
- Tudo coisa de velho!!!
- Todos falam que pareço muito mais novo...
- E você acredita? É só pra te agradar, seu idoso!!!
- Ah, eu adoro PlayStation e Xbox, viro a noite jogando...
- Um velho querendo compensar as carências da infância distante!!!
- Putz... Mas minha virilidade ainda está como sempre foi...
- Isto é porque você ainda não fez o “toque”!!! (...) ou fez? (...) kkk!!!
- Desisto... Vencido por mim mesmo...

Recuso-me a aceitar que estou ficando velho, mesmo constatando que a geração após a minha é a juventude atual. Que dureza, preciso deletar todas as músicas do Eagles, Elvis, Clapton e Commodors... O que manda agora é Justin Bieber, Miley Cyrus, Jonas e Lady Gaga. O raio é que ao escutar isso tenho a impressão de que meus ouvidos estão se transformando em penico. Desisto outra vez, vejo que aproximo-me suavemente do momento em que filósofos e imbecis têm o mesmo destino... Mas nada de epitáfios, preciso manter ao menos a dignidade.

sábado, 13 de novembro de 2010

Beleza, Vitória, Amor

Não chame o meu amor de Idolatria
Nem de Ídolo realce a quem eu amo,
Pois todo o meu cantar a um só se alia,
E de uma só maneira eu o proclamo.
É hoje e sempre o meu amor galante,
Inalterável, em grande excelência;
Por isso a minha rima é tão constante.
'Beleza, Vitória, Amor', eis o que exprimo;
Em um, três temas, de amplo movimento.
'Beleza, Vitória, Amor' sós, outrora;
Num mesmo ser vivem juntos agora.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Factum iam suus

Cerca de 55,7 milhões de brasileiros transformaram uma guerrilheira do grupo VAR-Palmares e donzela em pleitos eleitorais na primeira presidente do Brasil, e é uma mulher... veja lá o que é isso.

Este não é o primeiro feito mirabolante do petismo, basta lembrar que o atual foi o primeiro semi-analfabeto, alcoolista, ex-metalúrgico e imune a escândalos presidente da república – e segundo pesquisas cerca de 80% da população acha isto lindo, inclusive o Obama.


Encontre ao menos uma justificativa lógica que a torne pessoalmente merecedora de exercer tal ocupação, o que a fez digna de seu voto?


Só foi apresentada ao eleitorado uma possível continuação daquele que foi o governo que mais prevaricou nos últimos tempos, claro que uma versão absolutamente lúdica, realizadora, competente e feliz. Pudera, o país tem a saúde e a educação perfeitas, sem retoques, uma carga tributária justa... Ué, esta não é a realidade que você vê? E votou na continuidade desta realidade por quê?


Não se falou do passado dela porque está registrado nos incógnitos documentos do Arquivo Nacional, cuidadosamente retirados de circulação pelo presidente do STM durante o período eleitoral, documentos que por sinal a levaram à prisão na década de 70.


Mas agora isto não tem importância, quaisquer que sejam os motivos, “relaxa e goza” como diz uma outra petista. FACTUM IAM SUUS.


Não se tem a menor idéia do que esperar, ela foi apresentada ao Brasil de acordo com a conveniência do momento e agora só nos restam os efeitos da abertura da caixa de pandora comprada pelo povo e vendida pela competentíssima equipe de marketeiros do PT.


Voto de protesto contra a direita que não sabe ser oposição, voto por tabela, voto na menos feia entre os candidatos, voto de agradecimento por deixar de ser classe D e E, voto de ignorante que se acha inteligente, voto de desmemoriado, voto contra FHC que nem era candidato, voto em Lula que também não era candidato, voto porque gosta da cor vermelho, voto para continuar mamando nas tetas do governo...
Todos a elegeram e nenhum foi para ela.
 
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